O Movimento Interfóruns de Educação Infantil do Brasil (MIEIB) vem a público manifestar
seu posicionamento sobre a questão nacional do corte etário, mais precisamente sobre a
permanência das crianças de cinco anos de idade na pré-escola. O MIEIB sempre se posicionou a
favor da matrícula das crianças de cinco anos em instituições de educação infantil, sejam elas
públicas ou privadas.
O corte etário é o estabelecimento de uma data comum para que todas as crianças
brasileiras, indistintamente (nas áreas urbanas e no campo, que frequentam escolas públicas ou
privadas), sejam matriculadas na educação infantil e no ensino fundamental. Trata-se de uma forma
de organizar o sistema educacional, já que esta data garante, com clareza e precisão, a equidade
na idade de ingresso de todas as crianças brasileiras nos sistemas e redes de ensino, em todo o
território nacional.
Durante muito tempo, a data definida para matrícula foi o dia 30 de abril. A partir da
homologação da lei que ampliou o ensino fundamental de oito para nove anos - Lei nº 11.274, de 6
de fevereiro de 2006i
(BRASIL, 2006), houve um tempo de indefinições. Até que o Conselho
Nacional de Educação (CNE), por meio das Resoluções nº 5ii de 2009 (BRASIL, 2009), nº 1iii e nº
6
iv, de 2010 (BRASIL, 2010), definiram como data limite para o corte etário, o dia 31 de março.
Acreditamos ser fundamental o estabelecimento de uma data unificada para matrícula, pois
não determinar o corte etário impacta, pelo menos, de duas maneiras a vida das crianças e os
sistemas de ensino. O primeiro grande impacto é que crianças muito novas ingressariam no primeiro
ano do ensino fundamental. Antes da decisão Supremo Tribunal Federal (STF), em 01/08/2018, que
julgou constitucional a fixação da data limite de 31 de março para que estejam completas as idades
mínimas de quatro e seis anos para ingresso, respectivamente, na educação infantil - pré-escola -
e no ensino fundamental, uma criança que completaria cinco anos somente no mês de dezembro
frequentaria durante todo o ano letivo a educação infantil numa turma de crianças de quatro anos.
Quando voltasse das férias escolares no ano seguinte, essa criança seria matriculada no primeiro
ano do ensino fundamental e lá ficaria com colegas que já teriam seis anos. Essa criança perderia
a oportunidade de frequentar mais um ano na educação infantil e, consequentemente, de
desenvolver-se melhor de forma integral, com destaque aos aspectos cognitivos, sociais, culturais
e emocionais, junto às outras crianças da mesma idade. O segundo impacto incide sobre a organização das turmas de educação infantil, nas instituições educacionais (públicas e privadas),
causando transtornos e dúvidas, tanto aos profissionais responsáveis pela gestão, como às famílias.
Desse modo, o MIEIB lutou, sempre lutará e atuará incansavelmente em defesa para que
as matrículas das crianças de cinco anos de idade (aquelas que completam seis anos após a data
de 31 de março) continuem a ser realizadas na educação infantil. Trata-se de fazer valer o que está
previsto em lei: todas as crianças até cinco anos de idade têm direito à matrícula na educação
infantil tendo, assim, a possibilidade de vivenciar a plenitude da infância, seja nos grandes centros
urbanos, seja nas regiões campesinas, seja nas instituições públicas ou privadas.
Algumas pessoas acreditam erroneamente que matricular as crianças menores de seis anos
de idade no ensino fundamental é uma forma de garantir-lhes o direito à educação. Isto é um
equívoco, porque o direito dessas crianças à educação já está assegurado desde a Constituição
Federal de 1988v e a sua matrícula na educação infantil tornou-se obrigatória a partir dos quatro
anos de idade, desde o ano de 2009, com a aprovação da Emenda Constitucional nº 59vi
. Portanto,
a luta do MIEIB para que essas crianças sejam matriculadas na educação Infantil é exatamente
para garantir seu direito a uma educação comprometida com a infância.
Tendo por referência o acúmulo de pesquisas e estudos sobre educação infantil produzidos
em âmbito nacional e internacional, o MIEIB sempre defendeu que a forma como a criança de zero
a seis anos de idade se relaciona com o mundo requer espaços adequados nos quais ela possa
brincar, descansar, experimentar e realizar atividades ora estruturadas, ora espontâneas e livres.
Turmas menos numerosas, organização do tempo e dos espaços que possibilitem um equilíbrio
adequado entre situações de cuidado e de educação que favorecem o desenvolvimento pleno de
meninos e meninas, maior oferta de experiências que envolvam o uso do corpo e de movimentos
amplos, são alguns exemplos que concretizam uma prática pedagógica apropriada às crianças
nessa faixa etária. A educação infantil é a etapa educacional que melhor pode educar essas
crianças e cuidar delas, promovendo e ampliando sua formação integral. Nesse sentido, antecipar
a entrada no ensino fundamental para a idade de cinco anos é uma forma de desrespeitar o direito
de ser criança e de viver a infância plenamente e como tempo de formação humana. A diferença
entre o que se espera na aprendizagem e desenvolvimento das crianças na educação infantil e no
ensino fundamental, nos indica que aquelas de cinco anos de idade, caso ingressem neste último,
serão submetidas a processos de avaliação e de sistematização de conhecimentos que lhes
exigirão aprendizagens com graus de complexidade e sistematizações incompatíveis com o
momento do desenvolvimento em que elas se encontram.
Reafirmamos que o compromisso e a luta do MIEIB compreendem a legitimação de uma
educação coerente com os processos de desenvolvimento integral das crianças, tendo em
consideração as vivências destas no tempo presente (no aqui e agora), reconhecendo e
favorecendo seus modos de ser e estar no mundo. É uma luta pelo direito das crianças à uma
educação de qualidade social para a primeira infância, assegurando-lhes o direito de viver a
plenitude de sua infância e tudo aquilo que este direito implica: o direito de brincar; de aprender
ludicamente; de conviver e interagir em espaços que lhe garantam liberdade e autonomia; à atenção
individual; à proteção e ao afeto, dentre outros. Enfim, as Instituições de educação infantil devem
promover práticas educativas capazes de respeitar seu ritmo, sua condição de aprendizagem e
desenvolvimento, seus desejos e seu direito de ampliar suas experiências como ser humano e
cidadão. Uma educação para que nossas crianças vivenciem ativamente sua primeira infância,
protegendo-lhes dos riscos da antecipação da entrada no ensino fundamental.
Portanto, diante da constatação da existência de datas distintas que definem o corte etário
em municípios brasileiros, o MIEIB vem a público ratificar seu posicionamento incontestável
em defesa do direito à educação infantil em respeito às infâncias e às crianças brasileiras.
Do mesmo modo, manifesta-se pela homologação imediata do Parecer CNE/CEB 02/2018vii
pelo Ministro da Educação, a partir do julgado pelo STF, uma vez que tal normativa orientará os
sistemas de ensino quanto ao alinhamento à norma nacional daqueles que vinham adotando
critérios divergentes (BRASIL, 2018), o que garantirá em todo o território nacional a resolução da
polêmica que só tem prejudicado as crianças brasileiras em seu direito a acessar a educação
infantil.
Ressalta-se, nesse posicionamento, que o Parecer em vias de homologação, alinha-se às
“normas anteriormente definidas pelo Conselho Nacional de Educação (CNE), especificamente
Diretrizes Curriculares e Operacionais Nacionais orientadoras da implantação e do desenvolvimento
de atividades educacionais em relação à Educação Infantil e ao Ensino Fundamental de 9 anos”
reconhecendo, desse modo, “a competência do Ministério da Educação e seu órgão normativo, o
CNE, para a definição do momento de efetivação das matrículas.” (BRASIL, 2018)
Assim, em defesa ao Parecer CNE/CEB 02/2018, o MIEIB destaca e apoia as seguintes
orientações desse egrégio órgão no sentido de dirimir definitivamente todas as dúvidas e
contradições que tem se evidenciado diante dessa questão:
[...] A data de corte etário vigente em todo o território nacional, para
todas as redes e instituições de ensino, públicas e privadas, para
matrícula inicial na Educação Infantil aos 4 (quatro) anos de idade, e no
Ensino Fundamental aos 6 (seis) anos de idade, é aquela definida pelas
Diretrizes Curriculares Nacionais, ou seja, respectivamente, aos 4 (quatro)
e aos 6 (seis) anos completos ou a completar até 31 de março do ano
em que se realiza a matrícula. [...]
[...] As normatizações vigentes sobre corte etário para matrícula de crianças
na pré-escola e no Ensino Fundamental, respectivamente, aos 4 (quatro) e
aos 6 (seis) anos de idade, produzidas pelos sistemas de ensino estaduais
e municipais, em dissonância com as Diretrizes Curriculares Nacionais,
necessitarão ser revisadas, observando o cumprimento do princípio de
respeito à hierarquia legal, a integração e a harmonização entre os sistemas
de ensino, fortalecendo o regime de colaboração estabelecido pela
Constituição Federal e pela Lei nº 9.394/96 (LDB). (BRASIL, 2018, grifos
nossos).
Pelo direito das crianças de cinco anos e idade à permanência na educação infantil, os
Fóruns Estaduais, Municipais e Distrital de Educação Infantil que constituem o MIEIB atuarão
firmemente em parceria com os Conselhos de Educação e órgãos de proteção aos direitos das
crianças no acompanhamento das matrículas 2019. Pelo direito das crianças de viver a plenitude
da infância. Pelo direito de meninos e meninas à educação infantil de qualidade social e pela
garantia da cidadania da infância brasileira.
Brasília/DF, 04 de outubro de 2018.
Comitê Diretivo do Movimento Interfóruns de Educação Infantil do Brasil (MIEIB)
i BRASIL, Lei nº 11.274, de 6 de fevereiro de 2006. Altera a redação dos arts. 29, 30, 32 e 87 da Lei
n
o 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, dispondo
sobre a duração de 9 (nove) anos para o ensino fundamental, com matrícula obrigatória a partir dos 6 (seis)
anos de idade. Presidência da República. Casa Civil, Brasília, DF, 2006. Disponível em:
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