23/04/2020

POSICIONAMENTO PÚBLICO DO FEIPAR SOBRE À PROPOSTA DE PARECER DO CNE



POSICIONAMENTO PÚBLICO DO FÓRUM DE EDUCAÇÃO INFANTIL DO PARANÁ (FEIPAR) RELATIVO À PROPOSTA DE PARECER DO CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO (CNE) SOBRE REORGANIZAÇÃO DOS CALENDÁRIOS ESCOLARES E ATIVIDADES PEDAGÓGICAS NÃO PRESENCIAIS DURANTE O PERÍODO DE PANDEMIA DA COVID-19
Prezado Senhor Presidente do Conselho Nacional de Educação, Luiz Roberto Liza Curi e demais conselheiros/as,

Diante da abertura da consulta pública relativa à “Proposta de parecer sobre reorganização dos calendários escolares e realização de atividades pedagógicas não presenciais durante o período de pandemia da Covid-19”, lançada por este Conselho, no dia 17 abril de 2020, o Fórum de Educação Infantil do Paraná (FEIPAR), movimento social no âmbito do Estado do Paraná que integra o Movimento Interfóruns de Educação infantil do Brasil (MIEIB) constituído por 26 fóruns estaduais, 1 fórum distrital e diversos fóruns regionais em diferentes estados, apresenta seu posicionamento, relativo à inserção da educação infantil na proposta de reorganização dos calendários das instituições educacionais.

Consideramos que a proposta de reorganizar o calendário letivo das instituições educacionais, do modo como proposto no documento publicizado por este Conselho, traz implicações graves para creches e pré-escolas, para as/os profissionais que nelas atuam, para bebês e crianças pequenas, bem como para suas respectivas famílias. Neste sentido, o FEIPAR defende que para a educação infantil se estabeleça a flexibilização do calendário, também acompanhada da flexibilização da carga horária anual. Tal defesa se ancora em quatro pilares de princípios e perspectivas:

I. A natureza e especificidade da Educação Infantil, conforme determinam a LDB Nº9394/1996 e a Resolução CEB/CNE Nº5/2009, tem como finalidade o “desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social” (art.29 da LBD Nº9394/1996) e as suas propostas pedagógicas “deverão considerar que a criança, centro do planejamento curricular, é sujeito histórico e de direitos que, nas interações, relações e práticas cotidianas que vivencia, constrói sua identidade pessoal e coletiva, brinca, imagina, fantasia, deseja, aprende, observa, experimenta, narra, questiona e constrói sentidos sobre a natureza e a sociedade, produzindo cultura” (Art. 4º da Resolução CEB/CNE Nº5/2009). Com estes propósitos, a oferta pública e privada no modelo de atividades e ações remotas e propostas na modalidade de educação a distância (EaD) para crianças da educação infantil comprometem o cumprimento dos objetivos e direitos assegurados pela legislação brasileira. 

II. Em nosso país, as condições estruturais e socioeconômicas das famílias estão demarcadas pela profunda desigualdade social existente, que restringe e impossibilita o acesso a bens básicos. Além disso, dentre as diferentes realidades destacamos que grande parte das localidades do Estado do Paraná situa-se no contexto do campo, onde não há sinal de internet, muito menos acesso ao ambiente da web, o local de moradia das crianças é distante até mesmo da creche e da pré-escola. A proposição de atividades pedagógicas por intermédio de Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs), via televisão ou internet, com exposição ou proposição de “tarefas”, ou ainda, de atividades impressas enviadas pelas escolas às crianças em seus espaços domésticos pode acirrar as desigualdades educacionais, considerando que a demanda das crianças pequenas e suas famílias exige condições de acesso e acompanhamento das mesmas, o que se coloca per se e, antecipadamente, como uma proposição excludente.

III. Ademais, segundo determina as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil de 2009, esta etapa educacional deverá ser “oferecida em creches e pré-escolas, as quais se caracterizam como espaços institucionais não domésticos que constituem estabelecimentos educacionais públicos ou privados que educam e cuidam de crianças” (Art. 5º da Resolução Nº5/2009) no coletivo, com destaque para o fato das interações adulto-crianças e crianças-crianças, além da brincadeira, se constituírem eixos da ação pedagógica; e, por isso, modos de promover o desenvolvimento integral e a construção de sua identidade pessoal e coletiva das crianças. Em tempos de permanência compulsória em âmbito familiar, com as instituições educacionais fechadas, ao considerarmos a dimensão pedagógica, cabe denotar a importância de oferecer às crianças oportunidades para brincar, imaginar, observar, experimentar, narrar, questionar e construir sentidos sobre o mundo e a sociedade, respeitando as características e dinâmicas diversas das famílias em suas moradias, sem o caráter de cobrança institucional e de cumprimento de tarefas remotas.

IV. O momento atual de pandemia e de excepcionalidade traz marcas, dificuldades e sofrimento para as crianças e suas famílias. As medidas de isolamento e distanciamento social implicam afastamento de familiares, amigos, escola, de espaços de lazer e convivência social o que impõe novos arranjos cotidianos e também uma sobrecarga de compromissos nos espaços domésticos. Algumas famílias podem estar desempenhando o trabalho que antes realizavam fora no ambiente da casa, o que as impedem de exercer a mediação necessária. Diante disso, a descentralização para as famílias de tarefas e propostas das instituições educativas para as crianças pequenas pode acarretar situações de angústia, ansiedade perante maior demanda e insuficiência de conhecimentos específicos e de tempo para mediação de atividades com as crianças. Dito isso, duas possíveis implicações: de um lado, como destaca o Manual de Orientações “#Menos Telas #Mais Saúde”, da Sociedade Brasileira de Pediatria, a exposição diária de mais de uma hora a recursos tecnológicos é prejudicial à saúde das crianças de até 5 anos, sendo inclusive não indicada para as crianças com menos de 2 anos, e por outro lado, a impossibilidade, de muitas famílias acessarem as sugestões remotas por não dispor de recursos tecnológicos e/ou acesso à internet para o desenvolvimento dessas tarefas remotas.

Diante dos argumentos acima, enfatizamos a necessidade de flexibilização do calendário, também acompanhada da flexibilização da carga horária anual a fim de proteger os bebês e as crianças pequenas, respeitar seus direitos e de suas famílias e garantir   que, este momento excepcional de enfrentamento a uma Pandemia, não signifique violação dos direitos fundamentais de parcela da população, com especial preocupação em relação às crianças em situação de vulnerabilidade e as que frequentam a Educação Infantil do Campo, indígenas e quilombolas.

 Atenciosamente,

Fórum de Educação Infantil do Paraná – FEIPAR

 Curitiba, 20 de abril de 2020.

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